Na Alemanha, o atendimento de pacientes acometidos pela Covid-19 foi equacionado em 6 importantes raízes, conseguindo salvar 50% dos pacientes de alto risco de morte e que no Brasil certamente chegam a óbito. Esses pacientes nem sempre são obesos, apresentam multimorbidade ou de idade avançada.1
Os doentes chegam a um centro terciário (usualmente, hospital das clínicas numa universidade) com baixa taxa de oxigenação do sangue, mas resistente à reversão apesar de intubado e oxigenado.2
A educação médica na Alemanha privilegia a formação científica, porquanto os profissionais médicos formados naquele país, em sua atividade clínica, elegem a aplicação da lógica matemática, em detrimento da empírica. No caso específico, após equacionalizado o tratamento de pacientes graves e gravíssimos, a lógica matemática aplicada à Medicina indicou, com enorme sucesso, 6 raízes, que se deixam monitorar com ferramentas matemáticas e com muita propriedade, por sistemas lineares e/ou equações diferenciais:
1. Transporte em Caixa de Vidro Branca de Neve3
O transporte do paciente até o hospital (ou transferência) é um momento de extrema importância, pois pode infectar o patrimônio mais valioso e oneroso do sistema de saúde pública de que se dispõe, nomeadamente o staff de atendimento médico-hospitalar, bem como seus assistentes. Se os profissionais da área de saúde forem, em grande parte, infectados, não há como evitar mortes em massa, dado que o atendimento médico-hospitalar sobeja inviável.
Para solucionar essa equabilidade, os alemães se utilizam de uma caixa denominada Schneewittchensarg (Caixa de Vidro Branca de Neve). Ela possibilita o transporte do paciente com enorme segurança e fora de perigo de que membros do staff de saúde sejam contagiados.
O equipamento, também conhecido como Epishuttle ou Epigard4, lembra um pouco o caixão de vidro de Branca de Neve. Mas a caixa de transporte é um produto de alta tecnologia. Fechado hermeticamente por uma tampa transparente, os pacientes podem ser transportados com a segurança de uma enfermaria de isolamento. Tripulações de aeronaves-ambulância e helicópteros estão protegidas contra infecções.
Por meio de aberturas circulares e herméticas, a equipe médica e socorristas podem cuidar e monitorar os pacientes durante o transporte. Também é possível conectar um ventilador mecânico de terapia intensiva.
Monitoramento: sistema de equações diferenciais.
2. Posição decúbito ventral
A ventilação mecânica em decúbito ventral (posição de bruços) é altamente recomendada em pacientes adultos. Preconiza-se ventilação mecânica em decúbito ventral por 12 a 16 horas por dia. Nessa posição, o paciente deve ser bem acolchoada para que ele obtenha o mínimo possível de pontos de pressão, sem feridas no rosto, por exemplo, dado que fica deitado por muitas horas.
Posição decúbito ventral é a terapia mais importante para um doente com Covid grave. Sem ela, secreção se acumula na parte de trás dos pulmões e a inflamação desenvolve-se com muita rapidez. Com esse procedimento, a parte dorsal dos pulmões é ventilada, possibilitando uma melhor recuperação em curto espaço de tempo.
Monitoramento: sistema linear.
3. Ventilação Mecânica
Pacientes com baixo valores de saturação de oxigênio arterial, tão logo hospitalizados, são entubados, assistidos por respiradores e submetidos a coma induzido. Mas nem sempre esses procedimentos colhem os resultados almejados. Isso, geralmente se deve a um envolvimento inflamatório de área dos pulmões, não raro bem superior a 80%. Com esse nível de comprometimento, os pulmões se tornam incapazes de produzir a oxigenação do sangue arterial.
Assim, a medida terapêutica não contribui para a melhora da oxigenação dos tecidos do corpo, pois os pulmões, devido à grave extensão da inflamação em nível de tecido pulmonar, impede a permuta gasosa (oxigênio contra gás carbônico) fundamental para a manutenção da vida. Com isso se faz necessário uma outra raiz que possa solver essa eventual situação.
Monitoramento: sistema linear.
4. Oxigenação por Membrana Extracorpórea
Como visto, a Ventilação Mecânica por si só não é suficiente para muitos pacientes gravemente enfermos; eles morreriam se não houvesse a possibilidade de conectá-los a um pulmão artificial e às condições de manejo na unidade de terapia intensiva.
A equação é simples: sem tecido pulmonar disponível para a permuta gasosa, resta impossível o transporte de O2 para todo o organismo. Dessa forma, surge a necessidade da oxigenação do sangue arterial de forma extracorporal.5
Isso implica no uso da oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO6, Extracorporeal membrane oxygenation), que é um componente importante dos algoritmos clínicos no tratamento da insuficiência pulmonar aguda grave (SDRA), principal ocorrência em pacientes acometidos pelo novo coronavírus. Os estudos observacionais demonstram o valor desse equipamento no tratamento da SDRA. O ECMO substitui a atividade pulmonar com a integração de bombas de sangue e ‘pulmões’ de membrana artificial (oxigenadores) em pacientes com hipóxia grave, como “último recurso”.7 8 9 10
A oxigenação por membrana extracorpórea (ECMO) é uma técnica de terapia intensiva na qual uma máquina assume parcialmente a função respiratória do paciente. O equipamento usa uma bomba para fazer o sangue circular através de um pulmão artificial para o processo de oxigenação extracorporal, após o quê retorna à corrente sanguínea de um doente grave. Eles são usados em pacientes cujos pulmões estão gravemente danificados (SDRA ) e não permitem mais as trocas gasosas a ponto de garantir a função respiratória.11
Na chamada primeira onda, os alemães observaram que cada terceiro paciente de UTI precisou de um equipamento ECMO para ter alguma chance de sobrevida.
Monitoramento: sistema de equações diferenciais.
5. Cortisona
Nos casos de infecção grave ou mesmo com risco de vida, além das medidas intensivas usuais, o tratamento com drogas semelhantes à cortisona, salva cerca de 87 em cada 1000 pessoas com Covid 19 crítica. Esta estimativa é assegurada com base em sete estudos com um total de cerca de 1700 participantes. Quanto mais grave a doença, maior o benefício. 12 13 14
O uso de Remdesivir, um medicamento antiviral é considerado com enorme restrições e incertezas. Parece ter uma vantagem, especialmente quando administrado logo após o início da oxigenoterapia. Um “tratamento de sobreposição” com Remdesivir e glicocorticóides também é usado. Atualmente, suspeita-se que o Remdesivir funcione melhor no início da infecção, quando o vírus se multiplica, pois bloqueia a “máquina copiadora” do vírus. Algumas clínicas abandonaram o uso de Remdesivir por inépcia do medicamento no tratamento.
No estudo randomizado com 1.062 pacientes, 541 indivíduos receberam Remdesivir e 521 receberam placebo. A administração de Remdesivir reduziu o tempo de recuperação em comparação com a administração de placebo. O efeito foi maior em pacientes dependentes de oxigênio que não necessitaram de qualquer forma de ventilação; nenhum efeito positivo foi observado no subgrupo com ventilação mecânica. 15 16
Monitoramento: sistema de equações diferenciais.
6. Vacinação Passiva
Com a recente evolução da chamada vertente inglesa do Covid-19, a Alemanha inclinou-se à ascensão dos anticorpos monoclonais, adotando de imediato a aplicação da novel e eficiente conquista da ciência no combate ao coronavírus. Essa variante do vírus possui uma particularidade altamente contagiosa e extremamente letal. O Governo alemão adquiriu 200 mil doses por 400 milhões de euros, correspondente ao vultoso preço de 2 mil euros (cerca de R$ 13 mil) por dose, para atender a vítimas do coronavírus de alto risco.17 18
O tratamento com soro de convalescentes, proposto há mais de 130 anos por Emil von Behring e Kitasato Shibasaburō, é utilizado desde o acometimento do ex-presidente Donald Trump, como alternativa para o tratamento de pacientes com SARS-CoV-2. Os anticorpos monoclonais, produto biotecnológico, podem neutralizar patógenos ao uso do sistema imunológico do próprio corpo e impedir que infectem outras células. Demonstraram ser eficazes em estudos clínicos em pacientes com doença inicial. Porém, sua produção é engenhosa e lenta. Por demais, as mutações podem causar ineficácia, exigindo o desenvolvimento de novas matrizes. Os melhores resultados foram obtidos em pacientes com alta carga viral que ainda não desenvolveram seus próprios anticorpos.19 20 21
Os vírus possuem em sua superfície as chamadas proteínas spike (forma circular em laranja, na figura) que possibilitam o acoplamento do virus com a célula humana, através do qual há a transferência de material genético para reprodução do vírus no interior da célula hospedeira.
Os anticorpos monoclonais têm a capacidade de neurtralizar as proteinas spike do virus. [Antikörper = Anticorpo]
Com a neutralização das proteínas spike, o vírus perde as condições de acoplar a célula do hospedeiro, interrompendo a ação viral no corpo.
Em princípio, eles são mais úteis nos primeiros dias de uma infecção, quando o sistema imunológico ainda não está produzindo seus próprios anticorpos. A partir da aplicação dessa biotecnologia, constatou-se que a administração precoce de plasma convalescente de alto risco contra SARS-CoV-2 em idosos com infecção moderada reduziu a progressão de Covid-19.22 23
Monitoramento: sistema de equações diferenciais.
Evidentemente, há a possibilidade de utilização de outras ferramentas matemáticas para o monitoramento dessas raízes, conforme a complexidade do caso. Mas dificilmente haverá de existir matematização tão precisa e eficiente como a adotada pelos alemães para vencer esta terrível pandemia.
Scientia omnia vincit.
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O projeto Jovem Pesquisador se desenvolve com Laboratório Virtual, aos sábados, das 8 as 12 horas, na plataforma Google Meeting. Podem se inscrever jovens alunos do Ensino Médio e estudantes universitários. Professores do Ensino Médio e Superior podem participar do projeto como preparação para a atividade de orientadores de pesquisas.
Inscrição: https://forms.gle/EPa8rajipnHkNy7i7
Informação: academiacearensedematematica@gmail.com
1https://www.thelancet.com/journals/lanres/article/PIIS2213-2600(20)30316-7/fulltext Consulta
2https://www.aerzteblatt.de/treffer?mode=s&wo=1041&typ=16&aid=216919&s=ECMO
3Schneewittchensarg
4https://www.aerotelegraph.com/epiguard-epishuttle-isolation-virus-transport-ausgefeilte-isolier-liegen-erleben-aufschwung-durch-corona
5https://www.aerzteblatt.de/nachrichten/115099/COVID-19-Weniger-als-die-Haelfte-der-beatmeten-Patienten-hat-ueberlebt
6Extracorporeal Membrane Oxygenation
7Kopp, R., Henzler, D., Dembinski, R. et al. Extrakorporale Membranoxygenierung beim akuten Lungenversagen. Anaesthesist 53, 168–174 (2004). https://doi.org/10.1007/s00101-003-0643-3
8https://www.researchgate.net/publication/263522264_ECMO_Therapie_in_einem_nichtuniversitaren_Zentrumsspital
9https://www.researchgate.net/publication/342995057_ECMO_als_Therapie_des_schweren_Lungenversagens_bei_COVID-19
10https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/32287627/
11https://www.aerzteblatt.de/treffer?mode=s&wo=1041&typ=1&nid=120028&s=ECMO
12https://www.hcm-magazin.de/behandlung-von-corona-patienten-mit-cortison-zeigt-erfolge/150/33820/405746
13https://www.aerztezeitung.de/Podcasts/Kortison-Lebensrettende-Praeparate-bei-schwerer-COVID-19-412649.html
14https://www.aerzteblatt.de/treffer?mode=s&wo=1041&typ=16&aid=217226&s=corona&s=therapie
15https://www.aerzteblatt.de/treffer?mode=s&wo=1041&typ=16&aid=217226&s=corona&s=therapie
16https://www.aerzteblatt.de/treffer?mode=s&wo=1041&typ=1&nid=119305&s=ECMO
17https://www.dw.com/pt-br/alemanha-vai-usar-novo-rem%C3%A9dio-contra-covid-19/a-56329665
18https://www.dw.com/de/corona-deutschland-antik%C3%B6rper-jens-spahn/a-56330140
19https://www.aerzteblatt.de/nachrichten/120427/SARS-CoV-2-Antikoerper-erzielt-primaerpraeventive-Wirkung-bei-Bewohnern-und-Mitarbeitern-von-Pflegeheimen
20https://www.aerzteblatt.de/nachrichten/117138/COVID-19-Zweiter-Hersteller-meldet-Wirkung-von-Antikoerper-Praeparaten-bei-ambulanten-Patienten
21https://www.aerzteblatt.de/nachrichten/120150/Studie-Multivalente-Nanobodies-neutralisieren-SARS-CoV-2-effektiver
22https://www.aerzteblatt.de/nachrichten/112572/SARS-CoV-2-Monoklonaler-Antikoerper-blockiert-Eintritt-in-die-Zelle
23https://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa2033700