Vestimenta no Conforto Térmico

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O isolamento térmico em decorrência da vestimenta é uma das variáveis que mais influenciam no estado de conforto térmico dos ocupantes dentro ou fora das edificações. Não à toa, nos preparamos para sair de casa pela manhã ou para uma viagem sempre pensando no que iremos levar para vestir de acordo como clima local e a estação do ano. Além das condições climáticas externas, outros fatores podem influenciar a forma como nos vestimos, como a presença ou não de um ambiente climatizado artificialmente, a idade e o gênero e acultura local. Nesta palestra serão discutidos desde princípios básicos relacionados ao isolamento da vestimenta na percepção térmica humana, bem como outros resultados de estudos de campo relacionados com o tema.

A vestimenta, desde os primórdios da humanidade, transcende sua mera função protetora, assumindo um papel crucial na modulação do conforto térmico do indivíduo. Através dos tempos, a busca por vestimentas que propiciem bem-estar em diferentes condições climáticas impulsionou o desenvolvimento de técnicas, materiais e tecnologias inovadoras, tecendo uma rica história de descobertas e inovações.

Desdobramentos Históricos

Desde a antiguidade, a vestimenta desempenha um papel crucial no conforto térmico. As primeiras roupas eram feitas de peles de animais, usadas para proteção contra o frio intenso. Estudos como os de Laver (2002) destacam que as civilizações antigas, como a egípcia e a romana, já desenvolviam têxteis específicos para lidar com climas variados.

Ao longo da história, a vestimenta evoluiu em conjunto com as necessidades e os desafios impostos pelo ambiente. Desde as peles de animais utilizadas pelos povos primitivos para se protegerem do frio até as complexas peças de vestuário desenvolvidas em sociedades avançadas, a busca por conforto térmico sempre esteve presente.

No antigo Egito, o linho era o tecido predominante, devido à sua leveza e respirabilidade, ideal para o clima quente e seco da região. Já na Grécia e Roma, a lã era amplamente utilizada por sua capacidade de isolar o corpo do frio. Na Idade Média, o vestuário em camadas era comum, permitindo que as pessoas se adaptassem às variações de temperatura.

Durante a Idade Média, a evolução das técnicas de tecelagem e a introdução de novos materiais, como a lã e o linho, proporcionaram maior diversidade nas vestimentas. Segundo Harris (2009), a Revolução Industrial foi um marco significativo, pois a mecanização permitiu a produção em larga escala de tecidos mais eficientes termicamente.

Com a Revolução Industrial, surgiram novos materiais têxteis, como o algodão e a seda, que proporcionaram maior conforto e variedade de opções. No século XX, o desenvolvimento de fibras sintéticas, como o nylon e o poliéster, expandiu ainda mais as possibilidades de criação de roupas com propriedades térmicas específicas. A pesquisa sobre esses tecidos sintéticos, trouxe uma nova dimensão ao conforto térmico. Esses avanços permitiram o desenvolvimento de roupas mais leves e com melhores propriedades de isolamento, como discutido por Gordon (2011). A evolução continua, com tecnologias recentes incorporando microfibras e materiais inteligentes que respondem às condições ambientais.

Desvendando os Mecanismos do Conforto Térmico

A ciência tem desempenhado um papel fundamental na compreensão dos mecanismos que influenciam o conforto térmico da vestimenta. A ciência por trás do conforto térmico das vestimentas é complexa, envolvendo a termodinâmica e a fisiologia humana. O corpo humano regula sua temperatura através de processos como a condução, a convecção, a radiação e a evaporação. De acordo com Fanger (1970), o conforto térmico é atingido quando a taxa de troca de calor entre o corpo e o ambiente é equilibrada.

Através de pesquisas abrangentes, os cientistas desvendaram os princípios da transferência de calor, da respirabilidade dos tecidos e da influência do design das roupas na percepção térmica do indivíduo.

Estudos pioneiros de Fanger (1966) estabeleceram a base para a compreensão do índice de conforto térmico, que leva em consideração fatores como temperatura ambiente, umidade, velocidade do ar e atividade física. Posteriormente, diversos pesquisadores, como Gagge (1971) e Stolwijk (1971), refinaram esses modelos, incorporando novos parâmetros e expandindo a gama de aplicações.

A investigação científica também se debruçou sobre as propriedades dos materiais têxteis e seu impacto no conforto térmico. Estudos aprofundaram o conhecimento sobre a condutividade térmica, a capacidade de absorção e retenção de umidade e a permeabilidade ao ar dos tecidos, permitindo o desenvolvimento de materiais cada vez mais eficientes na regulação da temperatura corporal.

Pesquisas recentes focam na análise de materiais que podem melhorar essa troca de calor. Smith (2013) sugere que tecidos de alto desempenho, como os utilizados em roupas esportivas, são projetados para maximizar a respirabilidade e a evacuação do suor, ajudando na regulação térmica. As propriedades dos materiais, como a absorção de umidade e a capacidade de secagem rápida, são cruciais nesse contexto.

Além disso, a ciência também investiga o impacto das condições climáticas e ambientais no conforto térmico proporcionado pelas vestimentas. Estudos de Parsons (2014) mostram que variáveis como a umidade, o vento e a radiação solar afetam significativamente a eficiência térmica dos tecidos. Dessa forma, a escolha do material certo para cada condição climática é fundamental para o conforto do usuário.

Quantificando o Conforto Térmico

O avanço do conhecimento sobre o conforto térmico da vestimenta depende em grande parte de metodologias experimentais rigorosas. Através de técnicas como calorimetria, manequins térmicos e câmaras climáticas controladas, os pesquisadores podem quantificar os diversos fatores que influenciam a percepção térmica do indivíduo.

Os enfoques experimentais são essenciais para entender e aprimorar o conforto térmico das vestimentas. Experimentos controlados em laboratórios simulam diferentes condições climáticas para testar a eficácia de diversos tecidos. McCullough e Hong (1994) realizaram testes extensivos com manequins térmicos para avaliar o isolamento térmico de roupas de inverno.

Outro método comum é o uso de sensores e tecnologia vestível para monitorar a resposta fisiológica dos indivíduos em tempo real. Estudos como os de Havenith (2002) utilizaram essas tecnologias para medir a temperatura da pele, a frequência cardíaca e os níveis de suor, correlacionando esses dados com a percepção de conforto dos participantes.

Ensaios de campo complementam os estudos laboratoriais, testando as vestimentas em situações reais. Gao et al. (2018) conduziram testes em diferentes estações do ano, avaliando a performance de roupas esportivas em condições de calor extremo e frio intenso. Esses experimentos ajudam a validar os resultados obtidos em laboratório e a ajustar as propriedades dos tecidos.

Estudos em laboratório também permitem avaliar o impacto de diferentes materiais, designs e combinações de roupas em diferentes condições climáticas. A coleta de dados fisiológicos, como temperatura corporal, frequência cardíaca e taxa de sudorese, fornece informações valiosas sobre o estado de conforto térmico do indivíduo.

Além dos testes em laboratório, pesquisas em campo também são essenciais para validar os resultados obtidos em ambientes controlados e compreender o comportamento da vestimenta em situações reais. Através da monitoração de indivíduos em seus ambientes habituais, os pesquisadores podem identificar os desafios e as oportunidades para aprimorar o conforto térmico da vestimenta no dia a dia.

Essas metodologias experimentais são utilizadas em diversos setores, como a indústria têxtil, a construção civil, a ergonomia e o esporte, para o desenvolvimento de produtos e ambientes que propiciem maior conforto térmico aos usuários.

O Conforto Térmico em Ação

O conhecimento científico sobre o conforto térmico da vestimenta encontra diversas aplicações práticas em diferentes áreas da vida. No setor têxtil, o desenvolvimento de tecidos com propriedades térmicas específicas, como respirabilidade, retenção de calor e impermeabilidade, permite a criação de roupas que se adaptam às necessidades de diferentes atividades e condições climáticas.

As aplicações das pesquisas sobre conforto térmico são diversas e impactam várias indústrias. Na moda, o desenvolvimento de roupas funcionais que combinam estilo e eficiência térmica é uma tendência crescente. Designers como Stella McCartney incorporam tecidos tecnológicos em suas coleções para oferecer conforto e sustentabilidade.

No setor esportivo, a roupa de desempenho é crucial para atletas. Marcas como Nike e Under Armour investem em tecnologias de tecidos que melhoram a performance e o conforto dos atletas em diversas condições climáticas. Tessuti (2017) discute como as tecnologias de compressão e a gestão da umidade são vitais para o conforto térmico em esportes de alto rendimento.

A indústria de vestimentas militares também se beneficia enormemente dessas inovações. Uniformes militares são projetados para proteger os soldados em climas extremos, com materiais que oferecem isolamento térmico e resistência ao vento e à água. Segundo Meunier (2015), as novas tecnologias em têxteis militares melhoram a eficácia e o conforto dos soldados em campo.

Na construção civil, o design de edifícios e a escolha de materiais adequados são cruciais para garantir o conforto térmico dos ocupantes, minimizando o consumo de energia para climatização artificial. A ergonomia utiliza princípios do conforto térmico para projetar postos de trabalho e ferramentas que minimizem o estresse térmico e melhorem a produtividade dos trabalhadores.

No esporte, o vestuário desempenha um papel fundamental no desempenho dos atletas, auxiliando na regulação da temperatura corporal, na prevenção de lesões e na otimização do rendimento. O estudo do conforto térmico também é relevante em áreas como a medicina, a aviação e a exploração espacial, onde o controle da temperatura corporal é essencial para a saúde e segurança dos indivíduos.

Exemplos de Aplicações e Projetos

  • Desenvolvimento de roupas para atletas com propriedades de respirabilidade, retenção de calor e impermeabilidade, otimizando o desempenho em diferentes condições climáticas.
  • Criação de uniformes para trabalhadores em ambientes extremos, como bombeiros e siderúrgicos, garantindo sua segurança e conforto térmico.
  • Projeto de casas e edifícios com ventilação natural e materiais isolantes, reduzindo o consumo de energia para climatização artificial.
  • Implementação de normas e regulamentações em diferentes setores para garantir o conforto térmico dos ocupantes em ambientes públicos e privados.
  • Roupas de alta performance esportiva: Marcas como Adidas utilizam tecidos que incorporam tecnologias de gerenciamento de umidade e ventilação, essenciais para manter os atletas confortáveis em diferentes condições climáticas.
  • Uniformes de trabalho para ambientes extremos: Empresas como Carhartt desenvolvem vestimentas para trabalhadores em condições de frio extremo, utilizando tecidos com alto isolamento térmico e resistência ao vento.
  • Roupas para astronautas: A NASA investe em trajes espaciais que mantêm os astronautas confortáveis em ambientes extremos, combinando materiais de alta tecnologia com sistemas de regulação térmica.
  • Moda sustentável: Iniciativas como a de Stella McCartney focam em criar roupas que não apenas são confortáveis, mas também sustentáveis, utilizando materiais reciclados e tecnologias que reduzem o impacto ambiental.
  • Tecnologia vestível: Empresas como Hexoskin desenvolvem roupas inteligentes com sensores integrados para monitorar a resposta fisiológica do usuário, ajudando na manutenção do conforto térmico durante atividades físicas intensas.

Referências Bibliográficas

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Nota: Parte do texto foi produzida em sinergia com IA.

Renata De Vecchi

Possui graduação em arquitetura e urbanismo pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (2006), mestrado (2011) e doutorado (2015) em engenharia civil pela Universidade Federal de Santa Catarina.

Estagiou por 7 meses no Indoor Environmental Quality Laboratory da University of Sydney soba supervisão do professor Richard de Dear.

Ministrou aulas e orientou trabalhos de conclusão de cursona Estácio de Santa Catarina.

Atualmente é pesquisadora do Laboratório de Eficiência Energética em Edificações (LabEEE/UFSC) e do Centro Brasileiro de Eficiência Energética em Edificações (CB3E), e professora substituta no Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFSC.

Tem experiência nas áreas de conforto térmico e qualidade ambiental, com ênfase nas edificações localizadas em climas quentes e úmidos, e na área de eficiência energética das edificações, com ênfase na etiquetagem do PBE Edifica para edificações comerciais, de serviços e públicas.

Lattes: http://lattes.cnpq.br/0594650510499319

Orcid: https://orcid.org/0000-0002-6141-9281

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